segunda-feira, 19 de setembro de 2011

Império

cont. História do Brasil - Boris Fausto

Houve mesmo uma Independência do Brasil?

     Quando a gente fala da Independência do Brasil, surge logo essa questão importante: afinal de contas, será que o Brasil não trocou simplesmente de dono? Antes era Portugal, depois de 1822 passou a ser a Inglaterra. De fato, a Independência e a abertura dos portos, antes dela, são fatos que favoreceram imensamente a Inglaterra, a grande potência européia da época; mas isso não significa que tenha havido uma simples troca de dono. A Independência obrigou à constituição de um Estado brasileiro, com seus órgãos de representação, com seus poderes, suas relações com o mundo externo. Embora seja verdade que a Inglaterra ganhou ainda mais influência, não é menos verdade que o significado do Brasil independente ia além da relação com a Inglaterra, ou com Portugal. Mas a Independência não saiu de graça: o país foi obrigado a pagar uma indenização a Portugal para garantir seu reconhecimento pelas potências européias e, para tanto, recorreu a um crédito aberto na Inglaterra. Outro ponto importante é que, em comparação com as repúblicas sul-americanas, a Independência brasileira se deu de forma até certo ponto pacífica, embora tenha havido luta principalmente na Bahia.

Qual a diferença entre a Independência do Brasil e das ex-colônias espanholas?

     O fato é que, enquanto a ex-colônia portuguesa se manteve unida, as antigas colônias espanholas da América do Sul se dividiram em vários países. Não existe uma explicação fácil para isso. O que se pensa, em geral, é que a elite brasileira, principalmente os presidentes de província, circulava por todas as regiões. Em outras palavras, existia no Brasil um esboço de direção burocrática que ajudou a manter unido o país. Ao mesmo tempo, um interesse muito forte estava por trás da manutenção da unidade, pelo menos em relação às principais províncias – esse interesse era a escravidão. Para manter e garantir os negócios da escravidão era importante que o país ficasse unido. Mas não foram poucos os problemas, as revoluções, entre a Independência e o ano de 1848, quando ocorreu em Pernambuco a Revolução Praieira.

Por que se fez aqui uma monarquia, entre repúblicas?


     Isso tem muito a ver exatamente com a força da monarquia, ligada à vinda de Dom João VI, quando a Colônia de certa forma se transformou em metrópole. Isso solidificou a idéia de manutenção da monarquia; e a passagem da situação colonial à de independência se fez pelas mãos de um príncipe português, que foi Pedro I.

Quais eram as características da monarquia brasileira?

     Ela não era igual às grandes monarquias européias, pois não houve uma aristocracia de sangue. Quer dizer, não havia uma nobreza com títulos e privilégios transmitidos por herança. Os títulos se esgotavam com a morte do titular, fosse ele barão, conde etc. Esses títulos eram um instrumento político muito importante: ao concedê-los, o imperador conferia prestígio e formava um circulo de fiéis.

Como ficou o Brasil, com a Independência?

     Logo depois da Independência se elegeu a Assembléia Constituinte, que começou a preparar a constituição. Mas foi grande a desavença entre Dom Pedro I e os membros eleitos da Assembléia, o que resultou em sua dissolução por parte do imperador; ele próprio assumiu a incumbência de dar ao Brasil uma constituição. A primeira Constituição brasileira nasceu de forma autoritária, imposta pelo monarca à sociedade. De cima para baixo.

Que pontos se destacavam na Constituição imperial de 1824?

     Ela deu ao imperador muitos poderes, entre os quais o mais importante talvez tenha sido o chamado poder moderador. Esse poder lhe permitia, por exemplo, nomear senadores vitalícios: recebia uma lista de três nomes e escolhia de acordo com sua vontade. Também lhe dava a possibilidade de dissolver a Câmara. Outro ponto importante da Constituição era a organização do sistema eleitoral, censitário e indireto. Censitário significa que as pessoas, para poder votar, deveriam ter um determinado nível de renda. Além disso, o voto era indireto, ao contrário do que acontece hoje. Os brasileiros votavam em um grupo de cidadãos com determinadas qualificações, e estas pessoas elegiam a Câmara dos Deputados. Naturalmente, ninguém elegia o imperador, que permanecia no poder até a morte. Outro traço do sistema eleitoral era o fato de os analfabetos poderem votar. Não se trata propriamente de espírito democrático, mas o número de analfabetos era tão grande que, se eles não votassem, o processo eleitoral na prática seria insignificante. Em grandes linhas, essa legislação eleitoral vigorou até 1881, quando ocorreu uma mudança importante. A chamada Lei Saraiva introduziu a eleição direta e, ao mesmo tempo acabou com o voto analfabeto.

Que fatos marcaram o Brasil Império?

     Do ponto de vista político, houve no Brasil Império três períodos: o Primeiro Reinado, com Dom Pedro I como imperador, até 1831; o período da Regência, até 1840; e o Segundo Reinado, com Dom Pedro II, até a proclamação da República, em 1889. O primeiro período foi marcado por duas disputas entre brasileiros e portugueses em torno do controle do país. Em razão dessa disputa, e também tendo em vista seus interesses na sucessão do trono de Portugal, Dom Pedro I acabou abdicando e voltando para a Europa, em 1831. Os portugueses ainda viam o Brasil como uma espécie de colônia. Por exemplo, os postos mais importantes do Exército brasileiro eram ocupados por oficiais portugueses.

Como se formou o Exército brasileiro?

     A história da formação do Exército no Brasil independente é longa. Nos primeiros tempos, os oficiais portugueses ocupavam os postos mais altos e, na base, havia uma massa de gente recrutada à força, ou que ia para o Exército só para ter o que comer. A monarquia valeu-se também de mercenários, contratando na Europa pessoas pobres que, muitas vezes, vinham para o Brasil pensando que iam ganhar terás e na realidade eram enquadradas no Exército.

E quanto à Regência?

     Na Regência, o Brasil foi governado por pessoas da elite, enquanto esperava a maioridade de Dom Pedro II, que acabou assumindo o trono com apenas 14 anos. Uma das coisas importantes da Regência foi a tentativa de descentralizar o poder. Os regentes procuraram dar mais força às províncias, diminuindo a dominação do poder central; queriam atender principalmente aos interesses das grandes províncias – Rio de Janeiro, São Paulo, que começava a crescer, Minas, Bahia, Pernambuco e poucas mais. Entre medidas tomadas para isso, suspenderam o poder moderador – ninguém mais podia dissolver a Câmara. Também suprimiram um órgão que existia no Primeiro Reinado, o Conselho de Estado, uma assembléia de gente idosa para a época, pois era preciso ter mais de 40 anos. Na linha da descentralização, foi criado logo no começo da Regência um corpo militar, a Guarda Nacional. Pelo menos no papel, ela seria formada por todos os cidadãos das províncias, que teriam por obrigação possuir armas e seriam convocados em caso de revoluções, ou de ameaças às fronteiras.

Que tipo de revolução ocorria?

     Desde a Independência, até mais ou menos 1848, houve no Brasil uma série de revoluções contra o governo central. Eram movimentos muito diferentes entre si e geograficamente distantes. Por exemplo, a Cabanagem ocorreu no Pará; a Farroupilha, no Rio Grande do Sul. Os integrantes dessas revoluções também não tinham características semelhantes. A revolução no Pará mobilizou principalmente uma grande massa de índios e descendentes de índios. Já na revolução Farroupilha os revolucionários eram brancos e os líderes eram sobretudo pessoas da elite. As reivindicações até certo ponto variavam, mas tinham em comum a forte oposição do governo central. Em alguns casos também se colocou em questão a natureza do regime, propondo derrubar a monarquia e instalar um governo republicano. Os revolucionários gaúchos criaram a República de Piratini, de curta duração. Em Pernambuco a revolta teve continuidade; a província já se insurgia contra os portugueses em 1817, voltou a se rebelar no Brasil independente, com a Confederação do Equador, e prossegue nesse clima de fermentação revolucionária até 1848, quando praticamente se encerra o ciclo de revoluções.

Como terminaram as Regências?

     A Regência terminou principalmente por pressão das elites das grandes províncias, que perceberam a necessidade de um comando centralizado. Em conseqüência, foi decretada antecipadamente a maioridade de Dom Pedro II, e iniciou-se assim o Segundo Reinado.


Quais os fatos mais importantes do Segundo Reinado?


     O longo Segundo Reinado foi o período mais importante do Brasil no século XIX. Até então, não se pode dizer que houvesse um sistema político bem definido. No tempo de Dom Pedro I houve o "partido brasileiro" e o "partido português", que não eram bem partidos, mas sim correntes de opinião. Nos primeiros anos do Segundo Reinado foram restaurados o poder moderador e o Conselho de Estado e se transformaram os dois primeiros grandes partidos brasileiros, o Partido Conservador e o Partido Liberal.


O que caracterizava os dois grandes partidos brasileiros?


     É comum se dizer que representavam a mesma coisa. Isso só é verdade em parte, pois se eles de fato representassem a mesma coisa, por que disputariam por tantos anos o poder e se dividiram tanto? O Partido Conservador era formado pela burocracia imperial, por altos funcionários da Corte, que se aliviavam aos grandes produtores de café da província do Rio de Janeiro. Os conservadores contavam também com apoio principalmente na Bahia, e também em Pernambuco. O Partido Liberal representava os interesses de São Paulo, Rio Grande do Sul e parte de Minas Gerais. Durante certo tempo, os liberais foram favoráveis a descentralização do poder, enquanto os conservadores reforçavam a Corte e sustentavam a centralização do poder nas mãos do imperador.




O que foi mais relevante no reinado de Pedro II?


     No plano da política externa, houve a Guerra do Paraguai, conflito em que o Brasil teve papel predominante. Foram construídas as primeiras ferrovias, expandiu-se a exportação de um novo produto, o café, e uma grande questão percorreu a sociedade: a escravidão. A partir de um determinado momento, ficou muito claro que a escravidão ia acabar. O problema era saber como liquida a escravidão no Brasil. Após uma série de leis - do Ventre Livre, dos Sexagenários - chegou-se à Abolição, em 1988.




Atualização 05/09/2011
Continua...