domingo, 24 de março de 2013

Reforma protestante








Luís Felipe Miguel, in: O Nascimento da Política Moderna – Maquiavel, Utopia e Reforma Ed. UNB.

 Para o autor as obras de Maquiavel e Thomas More estabeleceram um processo, inicial, de ruptura com o pensamento medieval. Até estes dois autores pensava-se o Poder Temporal (dos governantes) ligado ao Poder Religioso (Papal).

      Com eles se inicia a ruptura que será completada pela Reforma Protestante.

       A Reforma Protestante é datada de 1517, tendo como liderança o monge, professor e Doutor em Teologia Martinho Lutero. Seu contexto inicial é o Sacro Império Romano Germânico (a atual Alemanha).

         Lutero estabeleceu polêmica com o Papa Leão X, tendo como objetivo rever as práticas e dogmas da Igreja. Daí a ideia de Reforma. A mudanças se dariam dentro da própria Igreja. Como as ideias luteranas não tiveram forma de se estabelecer a REFORMA OCORREU FORA DA IGREJA. Daí a ideia de CISMA.

 Mas por que Lutero obteve êxito onde outros não obtiveram.

     Luís Felipe Miguel, seguindo as ideias de L. Febvre indica que a motivação da Reforma foi Religiosa, mas aponta que seus desdobramentos atingiram os campos social, econômico e político.

         Assim:
                        a) para a enorme massa de camponeses, aderir à nova religião dava vazão às críticas à venda de indulgências estabelecidas por Roma e também às críticas às práticas corruptas. Assim Roma era entendida como um inimigo externo inviabilizando a unidade nacional;

                        b) para a burguesia a nova religião permitia fugir da condenação da usura (o acúmulo), que a Igreja pregava. Por outro lado, a compra de indulgências não era algo racional, porém necessário diante da força dos argumentos para a salvação do pecado;

                        c) para os príncipes, inclusive, Lutero foi protegido por eles, uma nova religiosidade permitiria romper com o lema (cujus régio ejus religios – que se lê cuyus regiã eyus religiã: a religião do rei é a religião do povo). Seria uma forma de afrontar o Poder do Imperador do Sacro Império (primeiro Maximiliano I e depois Carlos V) garantindo a autonomia em seus territórios.

     Assim, estes três elementos explicam a força das ideias de Lutero e sua instrumentalização em outros países, explicam as divisões religiosas. Na Inglaterra, por exemplo, Henrique VIII dividiu a nação entre católicos e anglicanos (religião similar, do ângulo dos rituais ao catolicismo, mas tendo o rei como seu papa: caput (cabeça)). Pode retirar terras da Igreja e tributos.

 a) As 95 teses e as ideias de Lutero e Calvino


      As 95 teses de Lutero afixadas na Catedral de Wittemberg em 31 de outubro de 1517, revelavam uma crítica ácida ao clero e, principalmente, à venda de indulgências.

     Mas, as ideias de Lutero não se encerravam aí. O autor propunha uma revisão também dos dogmas que poder ser entendida:

            a) simplificação dos sacramentos: somente 3: Batismo, Eucaristia e Confissão sem Penitência.
     Na Eucaristia, Lutero substituía a crença na transubstanciação (o pão e o vinho se transformam em corpo e sangue de Cristo) pela ideia de consubstanciação: o corpo e o sangue de Cristo estão presentes, mas não no pão e no vinho;

    Na confissão não requereria a penitência porque o perdão dos pecados só pode ser alcançado a partir da contrição (verdadeiro arrependimento);

            b) a leitura das escrituras sagradas é o caminho para a salvação. Lutero traduziu, para o alemão, o Novo Testamento em 1522 e, o Antigo, em 1534. Era necessário que o Homem lesse para entrar em contato com os ensinamentos de deus, visto que se negava a hierarquia eclesial e a interpretação ganhava papel importante (o livre arbítrio);

            c) a Salvação vem pela Fé. Mas, o livre arbítrio estava limitado.
Em polêmica com Erasmo de Roterdã, que acreditava que o Homem poderia escolher (livre-arbítrio) entre a obra de deus e a Danação (domínio do Diabo) para obter sua salvação, Lutero limita o livre arbítrio, dizendo que se o Homem pudesse se salvar sozinho deus perderia seu papel. Assim, não importa as obras para a salvação. Elas são o sinal de que o Homem é justo, mas sua justiça e sua fé são movidas por Deus. Só a Fé salva.


     Neste aspecto, outro teólogo deste período, João Calvino, francês, mas que governará em Genebra apresenta ideia diferente. “nem as obras, nem a Fé salvam”. O Homem já vem predestinado por Deus á salvação. Como reconhecê-la. O sinal da salvação estaria atrelado a uma vida de cuidados pessoais e de trabalho para a “construção da cidade de deus”, que é próspera. Neste sentido, a burguesia principalmente associou a prosperidade com a salvação. Mas Calvino, segundo o teólogo Antonio Máspoli, não faz referência ao lucro ou dinheiro, estabeleceu sim, uma ética do trabalho e não da prosperidade. Relata-se, inclusive, que quando estava próximo de sua morte (acometido por doenças) não deixou de trabalhar, pois dizia que deus não poderia encontrá-lo no ócio.

     Filósofos como Max Weber associaram a força das ideias calvinistas com o desenvolvimento do capitalismo, na medida em que a prosperidade alcançada com o trabalho se aliou a uma vida sóbria (sem luxo), o que permitiu o desenvolvimento de poupança e condições para o acúmulo de capitais.

     Outra ideia importante deste autor diz respeito à questão do poder> Acreditavam que havia um PODER RELIGIOSO (o maior, vindo de deus) e um PODER TEMPORAL (dos governantes).

      Afinal, como pensava Lutero a natureza dos homens maus só se verga a governantes de grande autoridade. E os bons cristãos? Estes deveriam, mesmo sendo bom, respeitarem o poder dos governantes (mesmo que estes fossem maus), pois caberia ao bom cristão da o exemplo de boa conduta. Por outro lado, nunca se sabia se o mau governante não era fruto da vontade de deus para testar o bom cristão.

     POR APRESENTAR ESTE CARÁTER CONSERVADOR EM RELAÇÃO AO PODER DOS GOVERNANTES, LUTERO E CALVINO FICARAM CONHECIDOS COMO REALIZADORES DA REFORMA MAGISTRAL (do Mestre, Perfeita).

     Lutero, inclusive, escreveu permitindo e incentivando o massacre de cerca de 100 mil camponeses liderados por Thomas Münzer, que se revoltou contra seus proprietários exigindo terras para produzir. Para Münzer era preciso melhores condições de trabalho para que os homens pudesses se dedicar à sua salvação. No entanto, Lutero condenou a ação, pois ela se distanciava da verdadeira reforma.

                       Estes camponeses são identificados com o Movimento Anabatista.


b) Anabatistas e Reforma Radical

Os Anabatistas, segundo Luís Felipe Miguel, formaram na Europa um movimento heterogêneo, mas existem alguns características que os assemelha.

1ª – negação do batismo na fase infantil e sua afirmação na fase adulta: O próprio nome anabatismo representava a ideia de negação do batismo. Mas os anabatista acreditavam no Batismo na fase adulta, pois postulavam que somente consciente uma pessoa pode escolher sua religião. Como castigo eram mortos – além de queimados e enforcados – afogados para ironizar o Batismo adulto;

2ª – prática da Caridade. Acreditavam que todos podiam (em potência) se assemelhar a deus, auxiliando seus irmãos. Assim a caridade e mesmo, cita-se, a utilização de forma coletiva da terra marcaram a sua organização;

3ª – Negação da Autoridade Temporal – se os homens são bons cristão, não devem se vergar a autoridade de outros homens, principalmente, maus homens. Assim, deve-se obedecer somente a deus. Essa negação da autoridade dos governantes e sua divulgação tornaram os anabatistas inimigos do Estado e sua perseguição se deu em toda a Europa.